Difícil começar esta crônica, difícil por vários motivos e o primeiro deles talvez seja porque eu possa vir a extrapolar no que vou dizer. Pelo menos a vontade é grande de libertar o verbo e desafogar a garganta. E porque não, lê quem quer, é ou não é?
Cara como essa vidinha é, ou pode se tornar miserável, e como é fácil sentirmos pena de nós mesmos, afinal de contas é o que estou fazendo de novo, mas só que dentro desta “pena”, me dou sim o direito de “berrar”, porque como diz Nelson Coelho de Castro “até para vadiar é preciso estar muito com Deus”, e é com esse pensamento firme de que desgraça pouca é bobagem, que vou lamuriar em algum ouvido alheio.
Não me considero um velho, mesmo tendo quatro décadas e pouco de vida, mas sim, digamos, “curtido”, é, seria esse o adjetivo, meio chulo, mas é isso, porque não foram poucos os obstáculos que a vida tem oferecido. Véio, cada uma que mais parece duas. Como diria Lady Katy, acho que é assim, do Zorra Total, roda aí o “fraschbeck”. Corre o ano de 1985, e eu com toda a “tesão” da idade, tentando uns “galeto”, jogando bola, Replicantes e Smiths tocando direto no toca-fitas da Brasília do véio, a boate do Tonho (Privê) sempre como opção, o Bar e Mesa do Kito, e o velho e inesquecível Casa Nossa, dos Pereira (na minha opinião o melhor bar que Santa Rosa já viu), aliás quem viu, viu e viveu, quem não, só lamento, tempos idos, não voltam mais.
Voltando a choradeira, um belo domingo, fui almoçar na minha Vó (saudades Oma), e na saída ela me deu a chave do Fuscão 78 do Vô e colocou uma carta no bolso pedindo que abrisse somente quando chegasse em casa. E assim foi feito. Logo ao chegar em casa, ainda cedo para dar uma banda no centro, resolvi ler a dita cuja, que, para minha surpresa, nela estava a revelação, e agora estou sendo sincero, mais cruel de minha vida, realmente me rasgou o coração e derreteu a mente quando li acho que por umas 20 vezes, que eu era filho adotivo. Véio, que paulada na mente, acho que até hoje não me endireitei. E aí culpados são todos, o coitado é você, é sempre assim.
Não vou negar, sem ter essa revelação aos 17 anos, com certeza minha vida teria sido bem diferente, isso é para mim claro como o dia, lógico que nem todos respondem da mesma maneira, mas comigo foi e é assim. Hoje sou um homem feito, pai de três lindos meninos, mas lá dentro do coração, puxa, como é difícil perdoar, mesmo quando até não ter o que perdoar, ainda sou o mesmo de 85, brigando por mais 24 horas de sobriedade, apesar de não beber a mais de 20 anos. Beber não, mas quantas consultas e quantos Rivotril, Lexotan, Anafranil e sei lá mais o que ainda terei que engolir.
Abro o coração desta maneira para fazer um pedido aos pais que tem filhos adotivos ou os que querem adotar. Adoção é uma das maiores demonstrações de amor que um ser humano pode dar, uma prova indescritível de amor ao semelhante pregado por Jesus. Mas não pequem por “esquecimento” ou, vou usar aqui talvez uma palavra um pouco áspera, egoísmo, medo de perder o filho adotado porque vai contar a ele que você é a mãe ou pai do coração e não biológico. Não se constrói uma família em cima de mentira, não tenha medo, a verdade sempre foi e continuará sendo o melhor caminho, e você não vai perder ninguém, tenha certeza disso, sei o que estou dizendo. Ou fica aqui então um apelo, conte logo, ou se cale para sempre, leve este segredo para o túmulo, o que não é impossível, mas é difícil, sempre tem alguém com a língua maior do que deveria.
Conheço minha mãe e meu pai biológicos, mas não adianta, é verdade sim, pai e mãe é quem cria e dá amor, não tenham medo, tenham fé no seu amor, só isso basta. Voltamos a conversar, assim espero.